O problema dos começos

Todo começo é complicado. Pensei um tanto e acho de verdade que a única coisa boa de começar é uma refeição – os magros de espírito discordarão. Começar numa escola nova, num novo emprego, numa nova cidade, numa nova igreja, começar um namoro, o casamento, a dieta, um livro, projeto, um filme, amizades. Nenhum absolvido.

Começar numa escola nova é uma das piores experiências da vida! Especialmente lá pela adolescência, sem conhecer ninguém, sem saber onde é a sala certa, para que lado fica a biblioteca ou o banheiro. Acho que até os mais desinibidos tremem na base numa hora dessas. É mais ou menos isso com um trabalho novo, só que não tem um professor para escalar suas atividades e orientar tudo que acontece, é hora de provar que seu currículo não é fake e que toda a sua segurança naquela entrevista tem algum embasamento. Pior quando é o primeiro emprego.

Eu morei em 9 cidades diferentes ao longo da vida (uma delas foi Brasília – nosso post campeão de acessos). Tentei fazer as contas, são aproximadamente 22 endereços residenciais, 22 números de telefone, 22 cancelamentos da NET e SKY – e afins, 22 CEPs, 22 tentativas de conhecer os vizinhos. Enfim aprendi que encaixotar as próprias coisas para a mudança evita muito problema. Também percebi que preciso aumentar a média de tempo em uma casa, duro cerca de um ano – concordado em contrato. Estou há 38 dias nessa casa nova aqui e faço votos para um relacionamento durável.

Não é que tenho prazer em mudar, só não tenho muito problema com isso. Essa última mudança está sendo a mais doída, a mais extravagante. Mudamos de país. Isso tornou todas as anteriores brincadeira de criança. Ainda assim, começar numa casa nova não é legal, milhares de caixas, faxina pesada, vai um tempo até você se localizar no bairro, e aqui tem um plus, vai um tempo até você conseguir se comunicar com seus vizinhos – não, espera, no Brasil acho que também era assim.

Sobre namoro meus números não convencem. Só tenho um. Mas posso dizer que até alcançar aquele clima gostoso de intimidade, confiança, aquela leitura rápida da pessoa, é necessário passar por um começo. Aí chega o casamento, depois de uns anos de namoro, os noivos descansam na sensação de conhecimento mútuo, sentimento que vai ser bombardeado dia após dia. Vai chegar o ápice incrivelmente maravilhoso um dia, sim, mas até lá, o começo. A depender do casal esse processo pode ser bem demorado, e tem quem desista antes de chegar lá.

Começar a ler um livro. Ainda que você esteja ao máximo animado com o título e a síntese a que teve acesso, é quase um relacionamento até você e ele se identificarem, depois flui, mas até lá: o começo. Muito parecido acontece quando você assiste aquele filme pela primeira vez. E por falar em relacionamentos, e as amizades? Tem amigos que você tenta engrenar e a amizade não avança de jeito nenhum, acho que amigo de verdade simplesmente acontece, depois de algum tipo de começo as cabeças vão se alinhando, o linguajar é claramente entendido, as expressões provocam risos, os trejeitos e gostos são parecidos, os hábitos e valores combinam, a confiança nasce.

E dieta? Quem nunca? Dizem que segunda-feira é o dia internacional de começar a dieta, aliás, a minha está agendada para alguma segunda-feira mais adiante. Esses dias olhei um vídeo da Céline Dion, a bichinha tem 47 anos e, gente, como deve ser essa sensação de ter o mesmo peso uma vida inteira? Acho que ela só engordou na gravidez e rapidinho acertou os ponteiros (da balança). Invejei só um pouquinho. Desculpa.

Meu filho começou na escola, ele fica lá 6 horas por dia e eu estou vivendo um tipo de síndrome do ninho vazio (aguarde o próximo post). Aí penso quantas coisas incríveis estou preparada para fazer, enfrentar, realizar, só que não dá. Estou desesperada por um começo extraordinário, sinto que tem muito de mim represado e que poderia fazer muita diferença em algum lugar, de uma maneira que eu não sei dizer. Mas só não consigo saber qual das portas onde insisto em bater irão abrir e me dar essa chance, essa brecha para mudar o mundo.

Os começos são muito chatos. Não gosto mesmo deles. Mas eu queria tanto um comecinho pra mim. Estou lidando com vários simultaneamente, mas falta um. Um comecinho especial, sabe? Acho que tem momentos na vida da gente que recomeçar é o melhor remédio. Enfrentar de novo o desconhecido, sentir aquele frio na barriga, sentir o bafo frio da insegurança, pensando assim acho até que o que está começando é um novo eu. Estou me construindo enquanto desconstruo alguns sonhos específicos demais, talvez. Enquanto descontruo quem eu era até ontem, até o meu último começo.

Enquanto isso vou lidando cuidadosamente dos pequenos começos que vão se acumulando sem receber muita atenção, afinal, é como teria dito Públio Siro 2 mil anos atrás: “As grandes coisas também nascem de pequenos começos.”

Você já tinha pensado nisso? Então acho melhor começar.

 

 Jeanne Moura

Jornalista, mãe do Noah, esposa do Manolo.

 

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